Roberto Amaral é escritor, cientista político e atual vice-presidente do PSB Nacional.
Nesse contexto, tudo permanecerá como dantes no quartel de Abrantes, porque aqui só se fazem reformas que nada mudem. Continuaremos em um regime no qual o eleitor é estimulado a votar segundo seus interesses imediatos e o eleito se sente autônomo em face da vontade do eleitorado. A cláusula de desempenho não salvará os partidos, que seguirão frágeis, muitos divididos em capitanias, estraçalhados pelo conflito de interesses de seus sátrapas, sem militância, sem hábitos republicanos, à mercê do poder político e do econômico, aos quais se curvam e dos quais são servos disciplinados. Cada vez mais caminhamos para a concentração do voto em poucos partidos, sem abrir o leque das alternativas políticas ou ideológicas.
Por esses motivos, toda discussão em torno de reforma política deve ser precedida por uma discussão sobre que Estado queremos. Queremos um Estado mais democrático? Comprometido com a geração e distribuição de riqueza, com a igualdade social, com a integração federativa? Ou preservaremos o Estado neo-liberal, promotor do salve-se-quem-puder, da lei do mais forte, da concentração de renda, riqueza e poder?
A reforma que defendemos deve aprofundar a democracia e preparar cada vez mais o Estado para a defesa da soberania, da emancipação nacional e da proteção dos desfavorecidos pelo regime econômico. O ‘estado mínimo’ é a cantilena dos que só querem diminuir os direitos sociais e trabalhistas e enfraquecer o processo nacional de desenvolvimento.
Essa reforma deve atrair a sociedade ao processo decisório e à gestão de seus interesses. Para isso, precisa aprofundar os mecanismos constitucionais de participação direta, aumentando, por exemplo, as hipóteses de plebiscito e referendum. A consulta popular deve ser a base da democracia e a ela precisa estar subordinada a vigência de emenda constitucional, assim como qualquer projeto de privatização de empresa essencial ao desenvolvimento ou à segurança nacional.
A prorrogação da vigência da democracia representativa – pois é disto que se trata –, exige a possibilidade de revisão de mandatos, como ocorre em alguns Estados norte-americanos (o recall) e em todos os níveis de poder na democracia venezuelana. Também exige o fim das reeleições e a limitação de eleições sucessivas para os parlamentos.
A fidelidade partidária, que deveria ser um valor republicano incorporado aos mores da vida política, tem que ser alçada ao nível de mandamento legal, cláusula pétrea da democracia. A maior representatividade político-partidária pode vir com o sistema de votação em listas. E o financiamento público de campanha, vedada qualquer outra alternativa, reduziria a presença do poder econômico nas eleições.
Nada, porém, deve estancar o aprofundamento do pluripartidarismo e do voto proporcional. O voto distrital, tão louvado pela direita, já existe, de fato, em nosso país, e é uma das causas do abastardamento da vida parlamentar. Se revela pela eleição dos neo-severinos da vida, consagrados nos grotões, ou distritos, aos quais não chegam os apelos do interesse nacional. São “vereadores federais”, procuradores de verbas e obrinhas, os deputados do cimento, do assistencialismo, das ambulâncias, da caixa d’água, despachantes de prefeituras, inevitáveis presas dos lobbies e dos “vedoins” de todo tipo. Eles formam a maioria, é o que nos disse a eleição do dia 1º de outubro. O voto distrital de fato é que nos deu o “baixo-clero”.
Em suma: o País carece de uma reforma mais profunda do que a que nos pode oferecer o Congresso, quer seja este em fim de melancólico mandato, ou o próximo. Só a mobilização nacional fará com que ela seja viável e coerente com as necessidades de um Brasil que se quer moderno e justo. Com a palavra, o cidadão.
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